sexta-feira, 23 de abril de 2010

Aristóteles e os começos do pensamento ocidental



A filosofia – amor amizade pelo conhecimento – ao começar não traz em si a noção de que se está começando algo filosófico. Os primeiros pensadores não se rotularam como filósofos, pois não possuíam o intuito de diferenciar-se dos demais habitantes da polis grega. Nesta direção, a idéia do surgimento dos primeiros filósofos vem por último. Ora, como assim? A partir de Aristóteles é que se concebe a idéia de que existiram os primeiros filósofos – logo, a filosofia primeira-, através de sua concepção de história da filosofia.

Daí compreende-se como necessário estabelecer o sentido de “primeiros filósofos”. De acordo com Aristóteles eles o são pelas suas abordagens, ou seja, devido às limitações de suas investigações, restringindo-as aos objetos físicos, que são aqueles encontrados na natureza e que possuem sua vida independente da ação humana. Diferentes dos objetos técnicos que são produzidos pelos seres humanos através de sua ação de criação.

O cuidado com a palavra residirá então no trato em relação aos diferentes significados da expressão “prótos”, que em grego significa primeiro. “Primeiro” pode significar o que antecede a tudo, ou então o que está adiante de tudo, isto é, o mais avançado. E também “primeiro” pode ter o significado de mais primitivo (bruto, rude, rudimentar, tosco). Assim, para se chegar à compreensão em Aristóteles “daqueles que primeiro filosofaram”, veremos o que é a filosofia segundo ele.

A filosofia para Aristóteles é o saber superior, mais livre e poderoso. Portanto é tarefa da filosofia emitir juízos que influenciem decisões em todos os campos da vida humana. E para se chegar a excelência de ser suprema, a filosofia tem como fundamentos e princípios as chamadas “primeiras causas”. E justo a partir destas “primeiras causas” que se constituem os fundamentos do conhecimento humano.

Além disso , será a partir também da compreensão destas “primeiras causas” que Aristóteles concebe a história da filosofia até ele – o filósofo mais filósofo segundo ele próprio. Ora, Aristóteles criou a concepção das “primeiras causas” primeiro e depois classificou os filósofos que o antecederam? Não. Ele buscou no pensadores que o antecederam os princípios para a concepção das causas primeiras. Que são quatro: 1) Causa material ( a mais simples); 2) Causa de movimento; 3) Causa formal; e 4) Causa final ( a mais elaborada). Assim, a estruturação das quatro causas se organiza da seguinte forma:


• Causa Material: que se constitui na matéria bruta com a qual irá se realizar determinado objeto.
• Causa de Movimento: que seria o trabalho exercido sobre esta determinada matéria.
• Causa Formal: esta irá se realizar a partir de uma idéia pré-estabelecida, tendo em vista como será a transformação desta determinada matéria, para que se obtenha a finalidade desejada em determinado objeto.
• Causa Final: realiza-se diante da finalidade ou objetivo da constituição deste objeto.


Exemplificando as causas primeiras a compreensão ficará mais clara. Um marceneiro ao fazer uma cadeira busca na madeira a matéria necessária para sua viabilização, esta seria a causa material. Ao exercer seu trabalho sobre a matéria – madeira – o marceneiro a transforma. Realiza-se a causa de movimento. A forma com a qual a cadeira irá ser construída, partirá de uma idéia prévia por quem a faz. Realiza-se a causa formal. E a partir da finalidade da cadeira servir para indivíduos sentarem-se constitui a causa final.

Por terem limitado suas investigações aos objetos físicos, os primeiros filósofos, de acordo com Aristóteles, teriam limitado também a investigação filosófica na causa mais simples, a causa material, e precisamente por isto, são vistos como “primeiros filósofos” no sentido de mais primitivos, dotados de uma compreensão inferior em relação a ele (Aristóteles), que teria chegado ao entendimento das quatro causas de formação dos objetos técnicos, aqueles que são transformados através da ação humana.

Sobretudo Aristóteles realiza uma inversão no pensamento grego acerca de “começo”, pois para o filósofo a compreensão de primeiro abriga-se no primitivo e imaturo, ao passo que no pensamento grego primeiro ganha o sentido de mais antigo e portanto mais elevado.

De acordo com Aristóteles o primeiro filósofo é Tales de Mileto, que afirmava que “A água é o princípio de todas as coisas”. Assim, expôs a filosofia primeira ou mais simples, encontrando abrigo na investigação da causa material quando da origem das coisas. Ora, porque então a filosofia mais simples? Pois Tales chegou à compreensão dos princípios de todas as coisas, sendo assim, é um filósofo. Viu na água – para Aristóteles o elemento mais simples visto que o fogo trata-se do elemento mais elevado -, o mais preciso princípio de origem das coisas, porém, limitando a sua investigação a uma causa material, por conseguinte, a causa mais simples, expondo assim uma compreensão primitiva das coisas, e nesta perspectiva Tales expôs uma filosofia menos perfeita, isto é, menos elaborada, na visão de Aristóteles.

Partindo da compreensão de Tales como primeiro filósofo na visão de Aristóteles, nota-se a importância da hierarquia em sua concepção de “começo”, de modo que esta hierarquia perpassa a compreensão das causas primeiras, sendo a causa material como a mais simples e a causa final como a mais elevada; a hierarquia dos elementos da natureza, tendo a água como o elemento mais simples e o fogo como o mais elevado,; e por fim a hierarquia que abrange sua concepção de história da filosofia, visto que Tales expôs a filosofia primeira no sentido de primitiva, pois estagnou sua compreensão na causa material, e Aristóteles teria elaborado a filosofia suprema, fundada na compreensão das quatro causas.

Portanto, justo na compreensão de tais hierarquias – das causas, dos elementos e dos filósofos – os fundamentos filosóficos quanto à compreensão das origens do pensamento ocidental se tornam inteligíveis, visto que estas três esferas, isto é, da compreensão das origens de todas as coisas, dos elementos da natureza e da história da filosofia estão, no sistema de Aristóteles, terminantemente ligadas.


Referência:
Bajonas Brito, "Os começos do pensamento Ocidental" (não publicado)

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